sábado, fevereiro 17, 2007

Sobre o endurecimento das leis

A crença de que leis resolvem tudo é generalizada - especialmente no que diz respeito à área social. Segundo a interpretação de muitos, a educação, por exemplo, só funciona (satisfatória ou insatisfatoriamente) por causa das leis. Esquece-se que o dispositivo jurídico/normativo é apenas um ponto de partida para que alguma coisa aconteça (ou que, às vezes, deixe de acontecer).

A lei no papel não vai, por exemplo, fazer com que a estrutura policial funcione de modo eficiente e, principalmente, civilizado. Aliás, um dos aspectos importante, e não lembrados nesse debate é que as leis estão aí para colocar limites à ação abusiva que o Estado pode dirigir, por meio de seus agentes, contra o cidadão.

Digo isto porque me chama a atenção no episódio trágico acontecido no RJ é o fato de que ninguém questionou a atuação da polícia.

Vamos pensar: caso a mãe do menino estivesse sozinha e os criminosos tivessem, apenas, levado o carro.

Ela iria até o distrito policial notificar o assalto. O mais provável é que a polícia não mobilizaria uma palha para resolver o caso. É claro que poderia ser diferente. Mas, infelizmente, esta situação é uma constante. Ou seja, o episódio seria tratado como mais um caso - banal - de assalto. Um escrivão redigiria de modo maquinal um BO e seria o fim.

Do outro lado, a quadrilha continuaria a agir impune. Assaltariam outros tantos cidadãos repetidamente. E mais, nunca seria enquadrados como monstros, facínoras, etc. Continuariam sendo ladrõezinhos-pé-de-chinelo. Desses que roubam bêbados ou assaltam carros nos semáforos (de preferência se o motorista estiver sozinho e se for uma mulher).

A fatalidade se fez no momento em que havia uma criança pequena no carro...

Aí, depois de acontecer o que eles (a polícia) classificaram como quadro de horror, agem.

Lembro-me da foto ridícula publicada pela Folha de S. Paulo: três PMs (um deles armado com um fuzil) conduzem o primeiro dos "monstros" que foi preso. O rapaz está algemado e um dos policiais agarra o queixo do preso para forçar a exibição do rosto.

A cena patética lembra a velha prática da polícia brasileira de cortar as cabeças dos criminosos e exibi-las como troféus (foi o caso do bando de Lampião).

O rosto assustado e contrariado do preso contrasta com o sorriso de escárnio dos policiais.

Mas aí, poderíamos fazer algumas perguntas incômodas: Em primeiro lugar, do que riem os policiais da foto? De um modo mais objetivo, o que faria a polícia do RJ se apenas o carro tivesse sido levado? Teríamos ações de inteligência para mapear esse e os outros furtos e assaltos realizados pela quadrilha? Haveria um esforço para identificar e deter os criminosos no sentido de diminuir a possibilidade de tragédias acontecerem?

Portanto, não adianta endurecer penas ou reduzir maioridade se continuamos a ter (só para começar) uma polícia como esta que está aí. Polícia que funciona de modo precário e sobre a qual não se tem controle. Que alimenta com cenas de tiroteio e cabeças abatidas a indústria do espetáculo, mas que é incapaz de dar segurança à sociedade.