terça-feira, janeiro 16, 2007

Rua do Sumidouro

Não sou geólogo nem engenheiro. Sei que os profissionais dessas áreas dificilmente dão crédito às evidências que não são aquelas apresentadas pelos estudos técnicos. O conhecimento científico e as medidas efetuadas com os mais diferentes instrumentos fornecem um quadro sobre o qual eles constroem modelos (muitas das vezes extremamente sofisticados) que dão as condições para que sejam conhecidas condições não diretamente visíveis e elaborados projetos para a construção.

Os modelos são sistemas de conhecimento da realidade. Contudo, eles têm seus limites. Eles são elaborados a partir de um conjunto de medidas que, por mais que seja levantado de forma extensiva, jamais dá conta de considerar todas as variáveis. Há intervalos sobre os quais se faz uma extrapolação dos dados da vizinhança ou de condições observadas em situações semelhantes.

Se há pontos críticos, mais medidas devem ser levantadas para tentar aumentar a certeza.

Elaborado o modelo, recria-se a realidade daquilo que, eventualmente, nem é visível. A partir daí, pode-se projetar.

Um novo modelo é construído. Agora, resultado dos conhecimentos que se possui sobre os materiais e as condições para a realização técnica de um trabalho, confrontado com o modelo sobre a realidade.

Em suma, faz-se, a partir do conhecimento formalizado pela ciência, uma antecipação de uma intervenção que o ser humano fará sobre alguma coisa.

O que dificilmente acontece é dar crédito a indícios, especialmente aqueles que vem do que é chamado senso comum ou de observações cuja origem se perdeu.

Falo tudo isso porque, ao que parece, os construtores da agora acidentada obra da linha 4 do Metrô de São Paulo não se atentaram para o fato de que, vizinho à mesma, há um rua cujo nome é Rua do Sumidouro.

Ora, o que é um sumidouro? Infelizmente, os dicionários não apresentam o sentido que os caboclos de São Paulo deram a este termo. No interior do estado ainda é possível ouvir os velhos contando histórias de pontos em áreas de várzea ou de brejo onde existem lugares de solo instável, extremamente perigosos, cujas trilhas devem ser evitadas pois se tratam de lugares onde as coisas afundam e desaparecem.

Isto me veio à memória porque, ao ver, na TV, as máquinas removendo a terra depois do acidente na referida obra, percebi que a mesma apresentava a mesma aparência da terra que vi ser retirada de um brejo, na minha infância, no interior de São Paulo. O referido brejo era famoso por ter sumidouros.

Não que não se pudesse construir sobre um sumidouro. Mas, provavelmente, seria necessário um estudo mais apurado para a elaboração dos modelos e do projeto. Além disso, mais material e trabalho mais cuidadoso seria necessário. Isto, evidentemente, exigiria mais recursos.

Bem, daí, nós saímos da engenharia e caímos na administração e na economia. E, pelo que eu também sei, são áreas cujos profissionais não dão muito crédito a nomes dados pelo povo aos logradouros, especialmente, se a origem do mesmo há muito se perdeu.