quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Autonomia das escolas - o que é isso?

Em post anterior, mostrei a minha estranheza em relação às declarações da secretária de educação do estado de São Paulo ao jornal Folha de S. Paulo. Meus comentários se centravam na afirmação feita pela secretária de que a autonomia das escolas tornou-se um fator determinante para a queda da qualidade de ensino nas escolas públicas estaduais. A surpresa, no entanto, ampliou-se na medida em que observamos o destaque dado à interpretação da secretária dada por meio de editorial pela mesma Folha de S. Paulo (clique aqui para ver).
A autonomia, que o jornal chama de autonomia curricular, é apontada como um dos ingredientes da receita para o fracasso da rede pública estadual de ensino de São Paulo. E, nesse sentido, o jornal louva a iniciativa da secretaria de educação elaborar e distribuir roteiros de conteúdos para serem seguidos por todos os professores da rede pública de ensino.
Todavia, para que não se trate do tema a partir meramente da opinião é necessário ter claro, em primeiro lugar, o que significa a autonomia da escola. Inclusive, para que os termos sejam entendidos de forma objetiva e não haja confusão de interpretação.
Para discutir esse ponto sugiro a leitura do texto de José Mario Pires Azanha que trata de juntar dois temas: a autonomia da escola e a proposta pedagógica (ver o texto aqui).
É interessante é observar que o autor procura mostrar que há uma relação entre esses dois elementos. Em primeiro a própria idéia de autonomia da escola, que ele sintetiza como sendo a possibilidade de as escolas tratarem, de modo objetivo, de suas demandas e necessidades no sentido de atingir os objetivos socialmente definidos para elas. Para tanto é necessário que elas assumam responsabilidades - que é um princípio da autonomia - elaborando a proposta pedagógica a ser implementada.
Mas, para isso, é necessário que os profissionais da educação estejam preparados para tal ação. Uma preparação que não pode ser apenas para tratar de ensinar alguma coisa para alguém mas, para além e sem deixar de considerar isso, precisa considerar o trabalho da escola como um todo.
Um grande desafio portanto.

Autonomia das escolas

É estranha a afirmação da secretária de educação do estado de São Paulo em entrevista publicada no jornal Folha de S. Paulo do dia 25/02 (p. A18 - ver o texto aqui) de que a baixa qualidade do ensino público decorre da autonomia pedagógica das escolas. Estranha e, também, preocupante. A gravidade das afirmações se torna maior na medida em que parte de alguém que é pesquisadora da área de políticas públicas e que, por isso, sabe distinguir uma afirmação ou idéia que provém da opinião pessoal daquela que provém do resultado de uma investigação que acontece de acordo com as regras da ciência.

Que elementos sustentam que a autonomia das escolas é o fator responsável pelo baixo rendimento da aprendizagem dos alunos das escolas públicas do estado de São Paulo? As evidências apresentadas são muito frágeis.

Sabe-se, porém, que uma afirmação proveniente da opinião pode ser útil como elemento retórico, contudo, não deve ser o elemento referencial de um plano de ação ou, ainda mais, de uma política pública.

No mesmo sentido, a situação embaraçosa ao falar das políticas de educação desenvolvidas nos últimos 13 anos em São Paulo decorre menos do fato de ter de emitir juízo de valor sobre o trabalho desenvolvido por membros de seu partido político e muito mais da falta de resultados precisos de avaliação das referidas políticas.

Ao se posicionar contra a autonomia, a secretária coloca-se em conflito tanto com as determinações legais quanto com o fato de que as escolas não são todas iguais e que precisam se organizar de acordo com as peculiaridades próprias. Imaginar uma ideal homogeneidade pedagógica das escolas é a ilusão de todo administrador que não tem dimensão da realidade do que é um sistema de ensino público. Parece difícil, ainda, para os administradores da educação perceberem que, ao invés de tutelar, é necessário tornar as escolas capazes de resolver os seus problemas.

De outro lado, é preciso ter claro o que se está entendendo por autonomia das escolas. As evidências são de que a Secretaria de Educação de São Paulo está entendendo a autonomia da escola como o poder de selecionar os conteúdos escolares a serem tratados nas aulas, a ordem dos mesmos e (talvez) os procedimentos didáticos a serem aplicados. Nesse sentido, há uma concepção de trabalho educativo que se resume à atividade de ensino. Trata-se de uma proposta pedagógica.

É possível até concordar com o argumento de que é necessária uma certa uniformidade do ensino, uma vez que se espera que os alunos sejam capazes ao fim de determinado ciclo de ensino, apresentar determinada aprendizagem. Contudo, o procedimentos didático poderá ser assim tão formatado?

A secretaria parece que aponta no sentido de uma inflexão em relação a uma certa orientação que vem sendo construída, pelo menos, desde os anos da década de 1980. Contudo, tal mudança parece que não se dá a partir de uma análise mais alargada dos resultados mas apenas sobre um certo sentimento de necessidade de um controle ou da tutela do trabalho educativo.

domingo, fevereiro 10, 2008

Planejamento, princípios ausentes e as escolas de lata

Um processo de planejamento, de um modo geral, comporta as seguintes etapas:
1) Conhecer a realidade sobre a qual se vai atuar;
2) Definir os princípios gerais da ação;
3) Definir os objetivos a serem alcançados;
4) Estabelecer uma programação;
5) Realizar as ações;
6) Avaliar.
Todas as etapas são importantes. Contudo, podemos dizer que a segunda etapa, a definição dos princípios que irão dar os rumos da ação planejada, é decisiva. Vamos mostrar como isso se aplica, por exemplo, numa política pública de educação.
Sabemos que a educação - e estamos falando aqui especificamente da educação básica - se constitui num direito social no Brasil. Ao mesmo tempo, o ensino fundamental é obrigatório e isso significa que é obrigação do poder público garantir vagas nas escolas públicas para todos nessa etapa do ensino.
Tal condição define de antemão um princípio no caso do planejamento de uma política pública de educação de um estado ou de um município: matricular todas as crianças no ensino fundamental. Contudo, outros elementos irão compor os princípios que definirão o planejamento da política pública de educação.
Para poder ilustrar a importância da definição desses outros princípios (que estão para além do que está formulado nas leis), sugiro a leitura de notícia publicada no dia 08 de fevereiro de 2008, no site do jornal Estado de S. Paulo, sobre a persistência, até hoje, das chamadas escolas de lata na cidade de São Paulo (clique aqui para ler a matéria).
As chamadas escolas de lata são construções que tanto podem ser módulos metálicos do tipo contêiner, quanto edificações cuja estrutura, paredes e cobertura sejam feitas de aço. Tanto uma como a outra forma se caracterizam pela inadequação à finalidade de abrigar uma escola (clique aqui para ver matéria sobre o desconforto térmico em escola de lata).
Além do princípio apresentado acima, que é definido anteriormente (está nas leis), pode estar presente no planejamento da política pública o princípio da utilização racional dos recursos - o que é muito importante, pois afasta a possibilidade do desperdício.
De outro lado, pode acontecer que os princípios não sejam formulados de um modo claro ou mesmo que haja mesmo a falta deles.
É o que parece acontecer nessa situação de existência de prédios escolares tão precários, como as escolas de latinha. Era necessário matricular todas as crianças, estava estabelecido buscar o menor custo. Faltava, no entanto, a determinação de que as acomodações físicas deveriam ser adequadas ao bom desenvolvimento da atividade educativa. Com isso, desde 1997 (segundo a matéria citada acima) existem tais escolas precariamente construídas. O longo tempo de existência das mesmas impede que se alegue que as mesmas eram provisórias.
Por isso, é elemento central na avaliação de uma política pública a verificação dos princípios fixados para a formulação das mesmas. Mas, nessa avaliação, não se pode olhar apenas os princípios que foram apresentados. Há necessidade de se olhar, também, para aqueles que não estão presentes e, por esta ausência, acabam definindo os encaminhamentos e as soluções adotadas na política avaliada.